terça-feira, 4 de dezembro de 2018

paciência

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Paciência

O conceito é o tempo da coisa.
HEGEL


A calma da planta:
em vida passada,
a alma de um homem
que encontrou da paz
ciência.

Suas folhas ao vento:
um há deus que não cessa.

Todo aceno um
à solidão solidária dos naveg-
antes – bravos desbravadores
do oitavo mar da saudades.

É o cerzir atlântico,
pacífico,
das ondas do verso
que embalam o
presente do poema,

um metro sereno e
severo, o movimento
da maré da memória.

(O branco da página
não é um nada,
é a soma de todos
os poemas possíveis,
a eternidade impossível [

essa nostalgia],

escre-
vê-la é inscre-
vê-la no tempo, da
poesia ao
pó.

Não fazê-lo, porém.
condena a humanidade
à paralisia da Página Perpétua,
esse horror, esse
Cthulhu kantiano.

[Como os investigadores
de Lovecraft, todo poeta
termina ou morto ou insano.])

Certas circunavegações,
soubem-no as plantas e os Pessoas,
exigem, a título de sacrifício,
determinados tipos de alma.

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quarta-feira, 14 de novembro de 2018

Os tocadores de fogo

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So Parmenides’s puzzle still remains for names of nonexistent items such as Santa Claus.
TIM MAUDLIN, The Defeat of Reason


Tudo é real, certo?
mas nem tudo é concreto:
por debaixo do asfalto,
uma praia se espraia,
de sóis só reflexos,
de ondas, ecos.

(Sereias soterradas.)

Acima – sacrilégio e progresso
– um carro percorre as ruas
enquanto a imaginação perfura
à procura do mineral das imagens.  
Um outro – ouro outrora estrela
ou minério de mim –, usar-se-á,
decerto, para transformar areia
em cascalho, este em pedras,
pedras em castelos de cartas
marcadas? Quem
o crupiê?

Ainda se reconhece: do ar poluído
que, de certo modo, a sustenta,
chegará, por cadeia imensa
(a imaginação, terrae incognitae verdadeira)
aos dragões pré-históricos
e, concomitantes e anteriores também,
aos vegetais que os alimentaram
e aos abundantemente habitados
arranha-céus, cujas copas não os
protegeram do destino mas do sol sim,
não que tivessem sido Ícaros
(eram – pobres de espírito – petróleo vivo),
quando muito alimento para o fogo
daqueles que descobriram a húbris
(forma ígnea diversa)
e daqueles que, do aquém-túmulo,
esgotaram o combustível até a última gota
ao tocarem o fogo – sim,
foi ardente a canção do fim –
na porra toda.
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sábado, 15 de setembro de 2018

The end (to be continued...) (expandido)

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The end (to be continued...)




O silêncio só fará
               (só será)    
sentido
após o fim dos tempos,
quando o onde já
não esconde
uma lista de end-
ereços
e,

nesse nada

nem ínterim nem interregno –

    ,       um náufrago não
          se afoga no afago
            das ondas
  ,

mas rios lavam e levam
restos de rostos,
de rastros restando
somente os risos
dos ossos, enfim
a felicidade sem fim                  
esculpida em outra                    
espécie de mar-                        

fim.                                         


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sexta-feira, 14 de setembro de 2018

The End (to be continued...)

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The end (to be continued...)




O silêncio só fará sentido
após o fim dos tempos,
quando o onde já
não esconde
uma lista de end-
ereços e,
nesse nada

nem ínterim nem interregno –

um náufrago não
se afoga no afago
das ondas,

mas rios lavam e levam
restos de rostos,
de rastros restando
somente os risos
dos ossos, enfim
a felicidade sem fim                  
esculpida em outra                    
espécie de mar-                        

fim.                       


...                  









segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Capitalismo tardio

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não o quê
não o por quê
não o quem
não o como
não o onde
não o quando
o quanto
antes


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sexta-feira, 10 de agosto de 2018

a culpa

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A culpa é uma casa
habitada por japoneses severos

(seus olhos são secos,
não piscam).

Um deles sempre exigirá seu crachá,
que, você pressente, estará em branco.

Tem a ver com a preciosidade do sangue,
que nutre a vida sob pressão
e repetição

(como uma mania, a vida
é um vício e uma culpa –
todo o tempo algo morre
dentro de nós e, mesmo assim,
continuamos vivos,

simultaneamente sendo –
e isso é um espanto –
a sepultura,
o coveiro
e o assassino).





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quarta-feira, 25 de julho de 2018

Argumento do fundo do poço

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Argumento do fundo do poço



Posso até ser,
mas só (se você
for);

posso até ver,
mas ó (na TV:
flor);

posso até ouvir-
me ou a ti,
som;

posso até tocar
tua pele ou
teus sentimentos
(dois instrumentos);

posso até saborear ou,
quem sabe, provar
que (r)existimos,
que isso foi
bom;

posso até sentir
de longe o cheiro de
amor;

tudo isso
assim que sair do fundo do
posso.

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terça-feira, 3 de julho de 2018

tick-toque

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tick-toque




Mil bocas na face.

Divinizar a pele pelo toque –
íntimo cubismo – afetivo.
(Arado, o dedo lavra
esse campo e planta
desejo – primeira linguagem
digital – nas estrias
para que o broto do coito
dê no desabrochar do gozo-
cógito).

Por outro lado (mesmo ângulo,
porém), o toque da fúria – o
punho – parte e des-
dobra a carne-Guernica:
ao toque da fúria – ao punho,
contudo –, se dá a outra face.

Mil olhos à vista.

À imaginação fetichista
todas as faces
da paisagem – daquele campo
tornado lábio, vagina
– chamada tempo: na topo-cronologia
do beijo (outra vez a língua),
todos são o mesmo,

o primeiro e o último,
o último e o primeiro,
o primeiro e o último,
o último e o primeiro,
o primeiro e o último,
o último e o primeiro
et cetera et alii et aliae et alia...

A tristeza do eterno
é a última tela.



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segunda-feira, 4 de junho de 2018

formiga, formigueiro

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Formiga, formigueiro




O bom do minúsculo
é ver monumental
o mundo.

Movimentar fardos,
a melancolia das vias
uma alegria.

Dura pouco a vida;

em todo caso,
fogo no buraco,
chumbo derretido
ou formicida –

holocausto mínimo –

neste lindo molde
de labirinto.


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domingo, 22 de abril de 2018

terça-feira, 10 de abril de 2018

à noite

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à noite



to-car a car-ne
(
o
verb-o o o-bjeto
o
sujeito o culto

) arcar com as con-
sequências
carregar a culpa (atonal)
até que seja tarde
da noite obscura

(ao abrigo da rua
o cor            p-
o        ração

[o imanente
não admite ascendentes

transcende])

não há cura
sob o ciclo da lua

somente perdas
infinitas

(nos polos a Terra – esfera – não gira
nos polos o raio torna-se zero
ou infinito, ou eterno)

quisera hesitar
evitar a certeza

mas não me engano
um dia (ou uma noite)
ela chega


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quinta-feira, 29 de março de 2018

Lobos

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Bela
é a vida
vivida numa ilha
ou num planetinha
como o do Pequeno Príncipe.

O abraço do arredor –
Vácuo ou líquido, nada ou água,
oceano no entanto – diminui a dor
de estar só.

Em comparação,
a vida na cidade dá saudades,
por isso (lobos anciãos), nos
isolamos (da alcateia), ínsulas

(“local isolado” ou “região
do córtex cerebral
oculta no fundo da fissura
entre o lobo parietal
e o lobo temporal”).

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quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

o homem na torre

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o homem na torre




Sóbrio sobe,
só e silente,
o homem na torre.

Ascendendo acende
um alô – olá! – de luz:
não chegue: rochas
à frente.

Aves voam,
naves evitam
o sólido vácuo – e
somem
(no horizonte).

Ou

ébrio desce,
vetado-lhe o adeus
de tênebras,
o homem na torre,
do seu Empíreo
sem nome.  

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sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

dentes

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dentes



Núcleo duro
ao redor do qual
a leveza dos lábios:
núvens de carne que,
tempestuosas,
se fecham em muxoxo; que,
solares,
se abrem em sorriso.

O céu da sua boca,
Paraíso.

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quatro mãos

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A leitura prévia –
presságio da sua (espécie de) –
lustra (sebo)
o livro órfão (antiguidade);
confere-lhe
outro autor:
de segunda
mão, relíquia
a quatro
escrita
(presente [lê]
passado a [li]
mpo).

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domingo, 7 de janeiro de 2018

Self à moda do chef

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Amigos, segue meu primeiro poema do ano. Talvez valha a pena notar q os versos são metricamente simétricos: 6, 5/5, 6 sílabas poéticas, respectivamente. Espero q apreciem :-)





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