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É pela janela que vem a solidão.
Estranho, tão estranho, ver o sol ao lado de outros astros,
como num filme de ficção científica.
O sol pertence ao dia, intuímos erroneamente;
o dia pertence ao sol, corrigimos, e isto está mais certo
embora nem sol nem dia existam solidamente (eu iria
escrever como uma rocha, mas nem mesmo uma rocha existe
solidamente, nada existe que não seja violentado
por bilhões de neutrinos a cada segundo).
Quis provar o vazio e resistir ao desespero. Estou há dias
sem lembrar e sem escrever. Provei também meu desprendimento
ao fazer e esquecer, sem anotar, dezenas de versos. Tive esperança
que não houvesse versos inevitáveis ou derradeiros; que nada de derradeiro
houvesse, ou de inevitável; que tudo fosse contingente. Mas então a
possibilidade do infinito não torna tudo possível, tudo certo
e infinitamente repetível?
Até o mais raro dos poemas existiria em infinitas variações
mas também em infinitas cópias perfeitas de si mesmo.
Se assim for, o que resta senão humildade infinita aos poetas?
Julgamentos de valor valendo eles próprios apenas localmente,
o que para alguns equivale a dizer nada valendo.
Procuro na janela por apatia; procuro a garantia de não haver nada
além da morte, de não haver além da morte para quem morre –
mas só encontro todo tipo de indiferença – a da luz estelar constante,
a da escuridão circundante, a do silêncio insensível, a do frio paralisante –,
todo tipo de indiferença menos a minha, o que me faz voltar à poesia.
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