...
padaria (um segredo)
À alvorada o orvalho
se esvai
na revoada de anjos –
odor
de café e pão fresco.
Ó, anjos
padeiros que apenas
são e não
padecem, descubram-me
o
paradeiro das
crianças perdidas
nas noites de
Carnaval, dos velhos
presos a eternas quartas-feiras
de
cinzas, das
sublunares meninas
que sangrarão por
toda uma vida...
Ó, anjos padeiros, dividam
o pão
igualmente entre os
homens que
penetram mulheres na
madrugada
e aqueles que penetram
outros
homens, entre as mulheres
que
sorvem homens na
noite e aquelas
que bebem outro
leite, vocês
que não veem diferenças
entre
o leve e o pesado,
entre o sério e o
jocoso, entre a
vagina e o pênis
pois em si têm o
equilíbrio do entre...
Ó, anjos por vezes odores,
outras
orvalho, outras ondas,
outras sêmen –
vocês que se
sacrificam sombras para
que a ilusão da luz
não se entre-
gue –, ao menos vocês
me atendem,
ao menos vocês entendem
este poeta,
ele mesmo arcanjo libidinoso
e eunuco
destinado ao coito
com a língua, das
asas arrancadas restando-lhe,
contudo,
uma pena (da qual não
é digno, entre-
tanto seja digno de),
pena de morte,
talvez, de suas trombetas
potentes
só um sussurro (um
segredo, porém).
...